Rússia impõe condição polêmica: Ucrânia deve ceder 20% do país para acabar a guerra”

Na tentativa mais recente de pôr fim ao prolongado conflito entre Rússia e Ucrânia, Moscou apresentou um novo memorando de paz que estabelece condições rigorosas para um cessar-fogo definitivo. O documento foi entregue durante a segunda rodada de negociações diretas entre representantes dos dois países, realizada nesta segunda-feira (2), em Istambul, na Turquia. O encontro ocorreu um dia após uma série de ataques sem precedentes promovidos por ambos os lados, que elevaram ainda mais a tensão no front.
Entre as principais exigências russas está a anexação formal de cerca de 20% do território ucraniano, abrangendo as regiões de Crimeia, Lugansk, Donetsk, Zaporizhzhia e Kherson. Essas áreas, atualmente sob controle das forças russas, são consideradas por Moscou como parte irremovível de seu território, após processos de anexação não reconhecidos pela comunidade internacional.
Além da cessão territorial, o memorando russo inclui outros pontos que, segundo analistas, são considerados inaceitáveis para Kiev e seus aliados ocidentais. São eles:
- Retirada completa das forças ucranianas dos territórios anexados;
- Fim imediato do fornecimento de armas, munições e inteligência por parte do Ocidente à Ucrânia;
- Realização de eleições gerais na Ucrânia, sob critérios ainda não especificados;
- Limitação drástica do efetivo militar ucraniano, com restrições no número de soldados e de armamentos;
- Proibição expressa da posse ou instalação de armas nucleares em território ucraniano.
Curiosamente, uma das exigências recorrentes da Rússia em negociações passadas — a proibição da adesão da Ucrânia à OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) — não foi mencionada no documento atual, segundo as agências estatais russas Tass, Interfax e RIA Novosti.
Como contrapartida, Moscou propõe o fim de todas as sanções econômicas impostas mutuamente, além da normalização das relações bilaterais, incluindo a retomada do fornecimento de gás russo à Ucrânia.
Guerra Ucrânia-Rússia, ataques inéditos aumentam tensão nas negociações
O contexto dessa segunda rodada de negociações foi marcado por uma escalada militar significativa. No domingo (1º), a Ucrânia realizou um ataque inédito em solo russo, utilizando drones escondidos em caminhões, que atingiram quatro bases militares espalhadas por diversas regiões do país, incluindo a distante Sibéria. A ofensiva, segundo o Serviço de Segurança da Ucrânia (SBU), destruiu ou danificou cerca de 40 aeronaves de guerra, um golpe simbólico e material contra a força aérea russa.
Em retaliação, a Rússia lançou, no mesmo dia, o maior bombardeio com drones desde o início do conflito, enviando 472 projéteis contra várias cidades ucranianas. O ataque russo, além de causar destruição em larga escala, reforçou a determinação de Moscou em manter a pressão militar, mesmo em meio às negociações diplomáticas.
Apesar do cenário belicoso, ambas as partes concordaram com uma nova troca de prisioneiros de guerra, abrangendo todos os combatentes capturados com até 25 anos de idade, além de feridos graves e doentes. O acordo inclui ainda a devolução mútua de 6 mil corpos de soldados caídos.
Divergências profundas permanecem
O ministro da Defesa da Ucrânia e chefe da delegação de Kiev nas negociações, Rustem Umerov, afirmou que o governo ucraniano irá analisar a proposta russa ao longo desta semana. Umerov também confirmou que foi entregue à Rússia um memorando com as exigências ucranianas, embora autoridades russas não tenham confirmado oficialmente.
Entre as prioridades da Ucrânia está um cessar-fogo completo e incondicional, bem como o retorno de todos os prisioneiros de guerra e das crianças ucranianas deportadas para a Rússia, cuja devolução também foi formalmente solicitada durante as conversas.
Por outro lado, Moscou mantém sua rejeição ao “cessar-fogo incondicional” e reforça a necessidade de, nas palavras do Kremlin, “resolver as causas profundas do conflito”. Entre essas “causas”, a Rússia exige que a Ucrânia renuncie definitivamente ao seu processo de adesão à OTAN e aceite a perda das cinco regiões reivindicadas por Moscou.
Essas condições, porém, são vistas por Kiev como absolutamente inaceitáveis. O governo ucraniano, liderado por Volodymyr Zelensky, insiste na retirada total das tropas russas de seu território e busca garantias concretas de segurança, com apoio explícito de seus aliados ocidentais, incluindo a presença de tropas estrangeiras em solo ucraniano — uma possibilidade firmemente rejeitada pela Rússia.
Guerra prolongada e negociações difíceis
O conflito, que se estende desde fevereiro de 2022, já causou dezenas de milhares de mortes entre civis e militares, com destruições maciças de infraestrutura em várias regiões da Ucrânia. A atual rodada de negociações, ainda que represente um raro momento de diálogo, evidencia o quão distante as partes estão de um acordo sustentável.
Os próximos passos serão cruciais. Uma terceira rodada de negociações está prevista para o final de junho, novamente em Istambul. Até lá, o cenário deverá seguir marcado por confrontos intensos, ações militares de ambos os lados e uma disputa diplomática em busca de apoio internacional.
Enquanto isso, o mundo acompanha atentamente, temendo que o impasse prolongue ainda mais um dos conflitos mais destrutivos e complexos da Europa desde a Segunda Guerra Mundial.